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sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Avaliação das Interações Farmacocinéticas entre Fitoterápicos e Fármacos é Dificultada pela Complexidade e pelas Variações Químicas dos Produtos Naturais

Como a fitoterapia é cada vez mais utilizada no mundo para o tratamento de várias doenças, deve-se ampliar os estudos sobre a qualidade, a segurança e a eficácia dos fitoterápicos. São utilizados os mesmos critérios dos alopáticos para avaliar estes parâmetros nos fitoterápicos, ou seja, a biodisponibilidade, as vias metabólicas de eliminação, os processos cinéticos e as interações medicamentosas. No entanto, outros desafios estão associados à pesquisa em fitoterapia já que os produtos fitoterápicos são complexos na composição química assim como são comumente consumidos como misturas de drogas vegetais, ampliando ainda mais a complexidade química e as interações, em oposição aos medicamentos com entidade química definida (alopáticos). Além disso, os fitoterápicos são freqüentemente administrados com os alopáticos. Por isso, já existem vários casos demonstrando interações medicamentosas com fitoterápicos. Este artigo discute alguns desafios a partir do atual estado da arte da investigação dessas interações.
O metabolismo dos fitoterápicos pode ocorrer por diversos mecanismos. A microflora intestinal afeta o metabolismo através da remoção de açúcares dos compostos glicosídicos e hidrolisam outros. Sabe-se, assim, que o ambiente intestinal pode variar muito entre os indivíduos, levando à especificidade dessas interações a nível individual. Entretanto, há dois fatores mais importantes para o metabolismo, tanto dos fitoterápicos como dos alopáticos, que são as enzimas das famílias do citocromo P450 (CYP) e da uridina difosfato (UDP) e da glucuronosil transferase (UGT). As enzimas da família da CYP são encontradas principalmente no fígado e no trato gastrointestinal e realizam reações de oxidação e de redução (Fase I). As enzimas UGT, encontradas em todo organismo, realizam, principalmente, reações de glucuronidação, reação classificada como de conjugação (Fase II), a qual é responsável pela preparação dos compostos destinados a eliminação (incluindo a Fase II de desintoxicação no fígado). A alteração da atividade das enzimas do CYP e da UGT por fitoterápicos é o mecanismo farmacocinético mais comum de interação medicamentosa entre fitoterápicos e alopáticos, o qual pode resultar em alterações nas respostas terapêuticas desses últimos devido a mudanças nas taxas de absorção, de distribuição, de metabolização e de eliminação (ADME). Interferência na atividade da CYP pode ser um processo relativamente rápido, resultando na redução da atividade dessa enzima, o que provoca um processo de eliminação mais lento. É comumente relatado que as interações medicamentosas resultem da inibição ou da indução da CYP ou da atividade da UGT. Embora seja demonstrado que vários bioativos de plantas sejam metabolizados pelas UGTs, sugere-se que as interações por meio destas enzimas sejam menos importantes do que as que envolvem as CYPs.
Tanto metodologias in vitro como in vivo são usadas nos estudos de fitoterápicos. Os ensaios in vitro são usados para avaliar os mecanismos em determinadas células ou tecidos, cujos resultados geralmente não se reproduzem ou os mesmos não podem ser extrapolados para o modelo in vivo devido à complexidade e à diversidade química dos bioativos contidos nos fitoterápicos já que a taxa ADME de cada constituinte é variável.
As investigações in vivo são úteis na identificação de possíveis problemas em relação à segurança ou à eficácia, entretanto, não se pode garantir que o resultado obtido dos estudos em animais possa ser verificado em humanos devido às diferenças metabólicas entre as espécies. Além disso, estudos clínicos em humanos são caros e por isso raro em estudos desse tipo. Outros desafios incluem a variação nos perfis de bioativos devido a diferentes períodos de colheita, métodos de preparação ou da sua própria estabilidade química, por isso, é aconselhável investigar os efeitos dos fitoterápicos nos métodos in vivo para inferir a ação da totalidade dos bioativos presente na droga vegetal.
Para detectar a inibição da CYP, métodos in vitro são usados, tais como os de fluorescência, luminescência, radiométrica e cromatografia líquida acoplada a espectometria de massa (LC-MS/MS). Apesar das vantagens dos outros métodos, a LC-MS/MS permite a análise de amostras combinadas. A inibição tempo-dependente é importante para avaliar a CYP, sendo usadas para isso culturas de microssomas hepáticas humanos. Linhagens de células imortais também são empregadas para medir a indução da CYP já que fornecem múltiplas vias celulares, são fáceis de manter em cultura e tem respostas repetidas em experimentos. No entanto, apresentam como limitações a perda de algumas características, tais como menor atividade enzimática ou expressão quando comparadas com células humanas normais in situ. Para medir a inibição da UGT são utilizadas microssomas de fígado humano com radiofluorescência e métodos cromatográficos. Linhagens de células imortais bem como hepatócitos humanos são utilizadas para detectar a indução da UGT, mas estudar as especificidades das isoformas de UGT ainda é um desafio.
Este artigo discute dois fitoterápicos amplamente estudados por interagir com outros agentes terapêuticos. Os extratos das folhas de Ginkgo biloba (GBE), o qual inibe a CYP em ratos, resultando em maior biodiponibilidade de diltiazem (medicamento usado para o tratamento da hipertensão). Outro estudo confirmou esta atividade in vitro. O GBE também alterou os efeitos da tolbutamida (usada para o tratamento da diabete) e do midazolam (usado para induzir o sono) em humanos, provavelmente por induzir a CYP2C9 e inibir a CYP3A4. No entanto, estudos sobre GBE e a CYP3A4 são conflitantes, não mostrando nenhum efeito sobre o midazolam, enquanto outros estudos mostram a indução do metabolismo do alprazolam. Pesquisa também mostrou que o GBE aumenta a atividade de CYP1A2 em ratos.
O hipérico (Hypericum perforatum) é amplamente conhecido por reduzir a biodisponibilidade de vários medicamentos por meio da indução da CYP3A4. Além disso, estudo in vivo mostrou que o hipérico diminui a biodisponibilidade do talinolol (bloqueador do receptor β-adrenérgico) através da indução da glicoproteína P. Pesquisa que avaliou o efeito do hipérico sobre a CYP3A4 e a glicoproteína P, importantes para o metabolismo da ciclosporina (usada no tratamento de transplantados), descobrindo que um extrato de hipérico com alta concentração de hiperforina reduz a atividade desse medicamento, enquanto extrato com baixa concentração desse bioativo não diminui. Estes resultados sugerem que a hiperforina presente no hipérico pode ser a indutora da CYP3A4 e da glicoproteína P, provavelmente através da ativação do receptor pregnano X(PRX), conforme mostrado em outros estudos.
Os autores afirmam que é fundamental conhecer o máximo possível sobre a eficácia e a toxicidade dos fitoterápicos, o que inclui o potencial para interações com diversos agentes terapêuticos. São definidos métodos para estudar os efeitos sobre as enzimas responsáveis pelo metabolismo dos medicamentos.  Este artigo descreve o atual estado da arte e a evolução do conhecimento sobre as interações dos fitoterápicos, ficando claro que são necessários mais estudos sobre os produtos mais usados em relação às principais enzimas envolvidas no metabolismo de medicamentos. Além disso, investigar o potencial das interações dos diferentes tipos de fitoterápicos com a CYP e a UGT ainda precisará de longo tempo para avaliação dos seus componentes ativos, mecanismos de segurança e os cuidados no uso.

Fonte:
Amy C. Keller
http://cms.herbalgram.org/herbclip/442/011261-442.html
Na DH, Ji HY, Park EJ, Kim MS, Liu K-H, Lee HS. Evaluation of metabolism-mediated herb-drug interactions. Arch Pharm Res. November 2011;34(11):1829-1842.

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